BC mostra que Cadastro Positivo reduziu juros nos primeiros 2 anos de operação

Banco Central emite relatório sobre os primeiros anos do Cadastro Positivo

Humberto

Humberto Bocayuva • Comunicação

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Em maio de 2021 o Banco Central encaminhou ao Congresso Nacional um relatório sobre os resultados alcançados com as alterações promovidas pela nova lei do Cadastro Positivo, e os resultados trazem um panorama favorável. Um destaque é o aumento do número de competidores no mercado financeiro, que já começa a possibilitar mais opções de escolha para consumidores e empresas na hora de contratar crédito.  

Essa é a avaliação da Quod, uma das principais empresas de inteligência de dados do Brasil e uma das operadoras do Cadastro Positivo. “O estabelecimento de uma nota de crédito [escore] para cada consumidor, definida de acordo com o pagamento de suas operações de crédito, de serviços continuados como de luz, água e telefone, por exemplo, irá, sem dúvida, tornar a análise de crédito mais inclusiva e justa”, destaca Ricardo Cervellini Thomaziello, diretor de dados (CDO) da Quod.

Ele observa que, embora o Cadastro Positivo tenha sido sancionado pela presidência da República em abril de 2019, só passou a vigorar na prática em janeiro de 2020, após o registro dos birôs gerenciadores da base de dados do Cadastro Positivo junto ao Banco Central e depois de cumpridos os 60 dias previstos em lei para que utilizassem os dados enviados pelas instituições financeiras.  

Um dos principais destaques do relatório do Banco Central, entregue no dia 3 de maio de 2021 ao Congresso Nacional, foi o efeito do Cadastro Positivo sobre a redução do spread bancário — a diferença entre a taxa de captação de recursos pelos bancos e a cobrada dos clientes nos empréstimos. De acordo com o documento, o comportamento do spread bancário, segundo um estudo empírico das operações de crédito pessoal não consignado para novos tomadores, demonstrou uma redução média de 10,4% dos spreads nas operações, quando comparado tomadores com pontuação no Cadastro Positivo com aqueles sem pontuação. Isto equivale a 31 pontos percentuais quando considerada a taxa de juros média de 299% ao ano.

O BC destacou também que os bancos começaram a usar o Cadastro Positivo em seus processos de avaliação de crédito em julho de 2020 e isso os ajudou a discernir o que era um problema conjuntural de uma questão estrutural de inadimplência de empresas e consumidores durante a pandemia.

Outro ponto positivo apontado pelo relatório é que a inclusão de informações do Cadastro Positivo nas pontuações de crédito resultou em migração de pessoas físicas entre faixas de risco de crédito, o que fez com que cerca de 41% migrassem para faixas de menor risco, 33% se mantivessem na mesma faixa e 26% migrassem para faixas de maior risco. Já para os cadastrados pessoa jurídica, 30% se beneficiaram com migração para faixas de menor risco, metade se manteve na faixa de risco e 20% passaram a faixas de maior risco.

Segundo Thomaziello, o relatório do BC confirma algumas previsões iniciais. “Por exemplo, aumentou o volume de crédito, mais consumidores foram incorporados ao mercado graças a uma melhor análise de crédito e a inadimplência diminuiu, assim como houve uma redução nas taxas de juros e no spread”, observa.

Na opinião dele, à medida que entrarem os dados de outros setores, como os de telecom, utilities e varejo, o Cadastro Positivo vai favorecer mais pessoas que não têm conta em banco e necessitam de crédito. “Com isso, teremos condições de ampliar o escopo de consumidores e estabelecer um escore com mais acurácia, definido não apenas a partir de empréstimos bancários, financiamentos imobiliários e cartão de crédito, mas também do pagamento de outras obrigações mensais.”

Thomaziello aponta ainda outros benefícios que a ampliação do Cadastro Positivo pode gerar para o país. Com base em estudo da Associação Nacional dos Bureaus de Crédito (ANBC), ele cita a possível inclusão de 22 milhões de novos consumidores sem acesso ao crédito, queda potencial de 45% na inadimplência e injeção de R$1,3 trilhão na economia.


Cadastro Positivo comparado à negativação.

Mas afinal, por que o Cadastro Positivo é tão superior à negativação e como em tão pouco tempo ele pôde trazer esses resultados?

Além das características citadas acima, apesar de ser uma base de dados relativamente nova, ele já tem muito mais registros que a negativação, porque todos os brasileiros fazem parte dele (adimplentes e inadimplentes). Enquanto a negativação tem cerca de 62 milhões de registros, o Cadastro Positivo tem mais de 107 milhões, mais de 72% maior que o modelo antigo.

Outro ponto muito importante é que o Cadastro Positivo é homogêneo. Ele traz dados regulares e harmonizados entre as instituições financeiras. Isso quer dizer que todas as fontes de dados enviam com a mesma frequência e com os mesmos parâmetros. Já a negativação é heterogênea. Cada credor trata a negativação de acordo com sua estratégia de recuperação e com variações de frequência ou valor. Ou seja, quando um consumidor atrasa o pagamento de uma parcela de um financiamento, há credores que negativam apenas a parcela atrasada enquanto outros negativam o valor total da dívida. 

Além de ser homogêneo, o Cadastro Positivo traz dados de hábitos de pagamento independentemente de estes estarem em dia ou atrasados, o que coloca em perspectiva se os atrasos são frequentes ou pontuais. Já a negativação é uma foto. Cada credor decide quando vai enviar os dados. Há casos também em que duas empresas do mesmo segmento de atuação têm prazos diferentes para negativar numa mesma linha de crédito. Enquanto a empresa A pode ser mais intolerante a atrasos, enviando faturas com 31 dias de atraso direto para negativação, a empresa B pode prezar mais pelo relacionamento, enviando apenas faturas de 60 dias ou mais de atraso para negativação. Isso não acontece com o Cadastro Positivo porque ele é atualizado semanalmente, com dados de pagamento, estejam quitados ou não.

Por fim, o Cadastro Positivo tem um órgão regulador que supervisiona o sistema e controla os participantes. Isso faz com que as empresas que participam dele tenham níveis elevados de governança corporativa, de prestação de contas e segurança da informação.  

Próximos passos

Apesar de ter bons resultados em pouco tempo, a jornada do Cadastro Positivo apenas começou.  O próprio Banco Central argumenta que o aumento do número de fontes de dados que reportam os dados positivos com boa qualidade e frequência estabelecida em lei é uma delas. A diminuição de assimetria de informações certamente ajuda no aumento da competição por empresas estabelecidas e por outras que desejam entrar no mercado.

Outra conclusão interessante do BC é que hoje o envio de dados ao Cadastro Positivo é quase voluntário de fato. Pela lei, além dos bancos, empresas de telecomunicações, energia, gás, atacadistas e varejistas são obrigados a compartilhar dados, mas não há sanções para empresas que não o fazem. A ausência de sanções pode levar a um efeito adverso: somente quem faz uso dos dados os compartilhará e ao invés de aumentar a concorrência por crédito, o acesso ao cadastro positivo pode se tornar restrito. Daí a importância de se continuar a ampliação das fontes de outros setores da economia, com qualidade.

A educação financeira foi o último item sugerido pelo BC. “Campanhas, comunicação aos cadastrados sobre as notas e conceitos que influenciam na definição dos limites de crédito, entre outras características dos empréstimos, e estimular a cultura da educação financeira também foram mencionadas como ações que podem ser relevantes”, conclui a entidade em seu relatório.